quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Antes daquele dia








Eu sentia seu suor exalar como um perfume naquela madrugada. Um cheiro que me deixava com um gosto acre na boca. Era bom, talvez porque eu sentia envolvimento, amparo, porque eu sentia sua força. Éramos tão diferentes, exceto por uma coisa. Retirei delicadamente sua mão áspera do meu peito enquanto molhava o travesseiro com seu líquido. Veio-me uma angústia por estar ali com aquele corpo. Cada segundo levava um minuto para passar. Eu podia ouvir a vida lá fora continuando enquanto estávamos ali parados, inertes. Sempre me vem essa sensação depois.
Antes era felicidade em tudo que eu fazia, em tudo que eu queria, em tudo que eu conquistava e buscava, esse corpo era o que é a felicidade. Sussurrávamos eu te amo enquanto gozávamos do intenso sentimento amor entre carícias, olhares e gestos doces. Dava-me gosto ir buscar o pão mais branquinho da padaria, você dizia que era mais gostoso, depois eu ia fazer seu café com muito açúcar, sempre com duas colheres de açúcar no copo, como você gostava. Eu gostava também, aprendi a gostar com esse amor. Não lembro muito do que eu gostava antes. Quando eu chegava com o pão e o café, você estava sempre saindo do banho, na verdade, eu me esforçava para chegar nesse exato momento, quando seus cabelos molhados, sua pele macia e cheirosa e seus pêlos estavam envolvidos por toalha branca, sempre e muito branca. Beijava-me a face e seus cabelos pingavam pequenas gotas em mim, pegava minhas mãos, como eram grossas as suas, e acariciava-ás com prazer, dizendo-me como eram macias as minhas. Éramos iguais em tudo. Logo, não só nossas mãos se tocavam, mas nossos amores. Eu gostando, você conseguindo. E o tempo passava sem se notar e os sons da vida lá fora eram músicas e pássaros a assobiar.
Depois, a vida corria, passava, estávamos velhos, secos. Você estava molhado de suor, mas sempre frio. Eu sofrendo e você, ainda conseguindo. Sua cara de prazer me angustiava, seu calor me acolhia e envenenava ao mesmo tempo. Éramos tão distintos, exceto por uma coisa, nossos corpos, que eram tão semelhantes. Meu amor morria ali naquele travesseiro.


Alessandra Prado Rezende

Pintura: Still Life de Mary Cassatt 

domingo, 22 de agosto de 2010

O vermelho

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“Ah se pelo menos o pensamento
não sangrasse!
Ah se pelo menos o coração
não tivesse memória!
Como seria menos linda
e mais suave minha história!”
Cacaso

Olhamos-nos e não imaginávamos que o outro seria como um pedaço de nós mesmos.
Quando o amor vem, ele nos toca suave. Não anuncia o poder avassalador que tem. O poder de machucar, de aniquilar, de rasgar.
Entregar-se é perigoso, é um descuido. A felicidade nos chega com mais freqüência, mas a dor pode nos chegar com mais intensidade, com mais força!
Alguns morrem de amor ao idealizá-lo. Muitos morrem de amor ao dominar. Outros morrem de amor pela dor. Poucos têm medo de morrer.
Eu, Eu gosto é da morte.
Seu olhar me flecha. Sua voz me consome. Seu toque me corta. Seus lábios me envenenam com um doce que disfarça o meu gosto acre.
Mergulho em espinhos amaldiçoados pelo amor. Espinhos envenenados de prazer, um alegre prazer de viver. Quanto mais fundo descubro, mais o amor me faz prender o fôlego e buscar mais, me arranhar mais.
Minha alma só não está drogada dos padrões mórbidos e do cotidiano fúnebre, quando encontra a sua em meio a tudo isso. Parece que não vivo. Nosso amor transcende o que nomeei real.

Pintura:    Mauve, de Giovanni Boldini 

Alessandra Prado Rezende

terça-feira, 15 de junho de 2010

"Creio que aqueles que mais entendem de felicidade são as borboletas e as bolhas de sabão" Nietszche


Ah... eu queria tanta coisa...
Eu queria, por exemplo, sorrisos.
Desses que vêm de dentro pra fora sem nenhum propósito... desses que expressão satisfação ou apenas bem-estar.
Eu queria elogios.
Desses que se dá sem querer outro em troca. Desses que não levam o estereótipo, como o de beleza ou outros determinados pela sociedade, em consideração. Ou desses que não incluem variação nenhuma do verbo “TER”.
Eu queria, também, o saber.
Desses que não precisamos pagar e que são essenciais para entendermos o mundo e todas as coisas, boas ou ruins. Desses que fazem de nós pessoas mais compreensíveis e toleráveis.
Eu queria ter menos medos.
Desses que nos impedem de realizar tantos sonhos. Desses que nos trazem angústias e diminuem nossas novas e boas perspectivas das coisas.
Eu queria ser rodeada de mais amor, sabe?
Desses amores indescritíveis e incondicionais. Desses que são o bastante por si só.... Não havendo necessidade alguma de dizer, seja por quaisquer meio, o quanto ele é grande, verdadeiro e perfeito.
Eu queria, ainda, mais conquistas.
Dessas que,de fato, trazem felicidade a longo prazo. Dessas que nos elevam o ego e nos fazem agradecermos por sermos nós mesmos.
Eu queria o humanismo.
Desses que, mesmo forçado, servem para ajudar outras pessoas. Desses que nos fazem mudar e passar a ver o outro sujeito ali na calçada como um ser dotado de dores, sonhos e sentimentos também.
Eu queria, para terminar, a felicidade.
Dessa que nunca consegui fazer parar para um chá, talvez. Dessa que eu só vejo passar... Até arrisco um cumprimento, mas ela está sempre ocupada para se dedicar a mim.

Alessandra Rezende

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Romantismo




Esconder o romantismo...

É uma forma de defesa de algumas mulheres.

Idealizar as pessoas, as relações, sonhar com o homem perfeito... por que não?
Mulheres bobas, inocentes?
Homens gays?

A brincadeira de posicionar as pessoas como números... fazer comparações de beleza, estipular padrões externos, querer sempre mais um... não passa de uma forma de submissão perante a sociedade e busca dos próprios valores.

Homens aproveitadores?
Mulheres fáceis?
Mulheres inocentes?
Homens gays?
Senso comum, não?

Há sensações q todo ser humano necessita e por isso acabamos entrando na brincadeira...

Sensação do afeto, de ser desejado, do carinho e até msmo do amor.

São só sensações... mas gostamos delas!

O negócio agora... é viver de fato esses sentimentos.

Alessandra Rezende

domingo, 13 de junho de 2010

Espero

O que quero, espero.

Futuro tão longe
E é já que lutamos.

Nem sempre o vento deixa as obras sonhadas intactas.
Nem o vento, nem as águas, nem os outros.

Nos sonhos, somos sós.
Na luta, uma.



Alessandra Rezende